quinta-feira, 29 de março de 2007

Elétrica

Ela apareceu completamente nua. Por hora fiquei excitado, querendo mostrar serviço. Acompanhei com os olhos as curvas dançantes daquele corpo escultural. Beijei o ar e me dei uns beliscões imaginando que o corpo dela já era meu. Senti a dor das unhas cravando em minha pele: não era sonho! Abaixei rapidamente o short, tranquei a porta do quarto e aumentei o volume da música para ninguém perceber ou escutar o som das “barbaridades” que estavam por vir. Acariciei um pouco meu pênis para dar a impressão de ser maior do que ele realmente é. Peguei um creme maravilhoso de massagem, esfreguei-o nas mãos e dei início à suspiros.
O atrito esquentava os dedos; dedos esquentavam toda a minha zona erógena; a minha zona erógena me fazia suar, espernear e ter uma adorável dificuldade de respirar. Eu poderia morrer ali, entregue, sem armas, sem dor. Mas não, sou muito jovem e ela também. Aquele belo par de seios ainda tinha muito que balançar com o meu ritmo ou com outros. Além disso, poucas mulheres sentiram inveja dela, do corpo em branco, sem nenhum risco de celulite ou qualquer outra marca do tempo. Com mais alguns anos, tenho certeza que a inveja alheia feminina triplicaria.
Em mente, nossos líquidos se juntam e tornam-se “uno” carnal! De repente, meus olhos começaram a tremer, envesgarem - tô quase lá! No entanto, tudo ficou escuro. A música também parou de tocar.

- Filho, acabou a luz! – gritava a minha mãe da cozinha

Eu olhei para todos os cantos do meu quarto e não vi ninguém. A cama estava suada, mas era apenas o meu suor. A única coisa quente - sem ser eu - era a TV, desligada pelo pico de luz. A solidão voou e aterrissou de volta. É triste saber que aquela bundinha gostosa e todo o resto desapareceram com a eletricidade, esfriando-me a um passo do gozo, deixando-me em choque.

- Filho, você sabe onde está o filme pornô que o seu pai alugou na noite passada? Não estou conseguindo achá-lo.
- ... – pensei.

quinta-feira, 22 de março de 2007

ERAS

Idade Média
“Pela estrada afora eu vou bem sozinha, levar esses doces para a vovozinha...”

Numa floresta, a Chapeuzinho corria riscos. Sua avó quase foi sacrificada. Já o lobo faminto, não contava com o aparecimento do caçador. Por fim, todos – menos este lobo mau – viveram felizes para sempre.



Idade Pós-Moderna
Chapéus, bonés, gorros e quaisquer outros objetos para a cabeça – ou não -, vivem fora da rota de extinção. A selva é de pedra e as florestas não são tão plurais assim. O lobo virou casaco e a vovó está no asilo – ou nas casas de bingo. E os que insistem em viver nas alcatéias humanas, reencarnam, com a mesma fome, nos corpos de Josés, Mários, Silvios, Jacksons, Micheles... Nesta era, ninguém é bobo de ir sozinho pela estrada afora, uma vez que a frase “saio e não sei se volto pra casa” se tornou um clichê doloroso. Por via das dúvidas, enviam os doces via-sedex ou mandam a padaria da esquina entregar em domicílio. Até o caçador foi corrompido pelas mudanças: o que era uma “ingênua” arma de caça, transformou-se em tanques de guerra, metralhadoras, mísseis. As serras e cerrados testemunham sons de serras elétricas e, embora a esperança ainda exista, o verde já não está atrelado a ela. Tal cor, infelizmente, foi obrigada a tirar licença das atividades denotativas e conotativas, pois está na UTI, esparramada sobre mesas, em coma profundo.
No fim, eles viverão felizes para sempre?

quarta-feira, 7 de março de 2007

Prisma humano


Descolorida é a morte. Sem aquarela, sem cores vivas, desbotada. Mas quem morre, vive, seja em lembranças boas ou ruins. E todos morrem e relembram. Nem todos vivem, porque isso não é apenas um verbo, sequer um verso. É essência, é dor e mistério. Fundamentalmente, atitude!

No Brasil não há neve como na Europa; os europeus são menos negros que os brasileiros. Até os nossos céus possuem azuis diferentes. Mas somos semelhantes nas cinzas da desgraça, do atentado terrorista ou da chacina esquecida.

Enlouquecemos juntos, com a belaza do arco-íris. Nele, uma ponte sem lei e destino nos leva para lugar algum. Cores misturadas dão origem a outras cores. Humanos misturados poderiam possuir os mesmos pensamentos? Não, pois o universo é incolor, ciano, margenta, black e yellow. A pomba, guardiam de nossa maior esperança, pode ser branca. No entanto, ela viaja pelo sentimento negro, que reside acima de nossas cabeças e atinge, em cheio, nosso coração.

O sangue é vermelho e poderia, também, ser fluorescente. Quem sabe desta maneira, as VÍTIMAS chamariam mais atenção do que a coloração das capas de jornais? Assim seguimos: numa realidade colorida, fotografada em preto-e-branco.